Vida, morte e fé no sertão

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O traço marcante e graficamente exuberante de Jô Oliveira colocou instantaneamente a trilogia de A Guerra do Reino Divino no patamar de grande clássico dos quadrinhos nacionais, desde que foi publicada pela primeira vez na prestigiada revista italiana AlterLinus #5, de maio de 1975. No Brasil, essas histórias foram reunidas num álbum lançado pela Editora Codecri um ano depois (leia aqui).

O desenho do mestre Jô Oliveira tem inspiração nas gravuras da literatura de cordel, típicas do Nordeste brasileiro e dão à obra um vigor visual que ainda hoje causa grande impacto. Numa época em que se lançam tantas edições especiais de luxo, muitas delas sem importância alguma, esta obra-prima deveria ser relançada com um tratamento gráfico mais refinado e adequado à sua grandeza histórica.

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Já que a história não é colorida, eu me atrevi a colocar cores nos desenhos do mestre Jô Oliveira nestas cinco imagens que ilustram esta postagem. Foi um atrevimento e, ao mesmo tempo, uma diversão.

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Veja aqui algumas páginas desta obra primorosa, e leia o editorial escrito por Ziraldo para a edição brasileira lançada pela Codecri.

Jô Oliveira na AlterLinus


O tempo passa impiedosamente, sem perguntar que dia é hoje, que horas são. Há dois anos prometi divulgar a capa da revista AlterLinus 5, com o desenho do nosso Jô Oliveira, quando escrevi o texto A saga nordestina de Jô Oliveira. Só agora me dei conta de que ainda não havia cumprido a promessa. Mas corrijo esta falha agora.

A data de capa da AlterLinus 5 é maio de 1975 e este era apenas o segundo ano da revista, que foi lançada na Italia em janeiro de 1974 com a missão de publicar principalmente histórias mais densas e de aventura, deixando sua irmã editorial, a famosa revista Linus, publicada desde 1965, com as tiras de humor.
 
Isso não quer dizer que a nova publicação deixaria de lado as tiras cômicas, mas elas teriam um espaço bem definido. Na AlterLinus 5, por exemplo, a exceção coube à Dropouts, de Howard Post, que ocupou as duas contra-capas. Foram publicadas também três páginas dominicais de Snoopy, de Charles M. Schulz, e uma história com sete páginas de Popeye, de Bud Sagendorf. Mas estas não eram tiras.

Presentes na edição outros grandes mestres do traço. A revista começa com o terceiro e último capítulo da história Viet Blues, uma aventura do detetive Alack Sinner, criado pelos argentinos José Muñoz e Carlos Sampayo. O desenhista Muñoz faz um admirável trabalho de claro-escuro nas histórias de seu personagem, além imprimir um ritmo cinematográfico nos cortes dos quadrinhos.

Acima, mais uma página de Alack Sinner, de Muñoz. Abaixo, Dick Tracy.

Na seqüência da revista aparece um clássico dos quadrinhos que ocupa nada menos do que 31 páginas: Dick Tracy, de Chester Gould. Em seguida, outra aventura onde o claro-escuro dá o tom gráfico da história: Yves Sainclair (página abaixo), de Claude Moliterni, com desenhos de Patrice Serres, desenhista francês que é discípulo do renomado Frank Robbins, criador de Johnny Hazard.

O belo conto L’uccello Adolfo, do famoso escritor e ilustrador estadunidense Edward Gorey, ocupa as oito páginas seqüentes (essa história pode ser “vista” no YouTube),

e elas antecedem à terceira e última parte de Riflesso, uma história de Valentina, de Guido Crepax.

Agora chegamos ao ponto alto de AlterLinus 5, de 1975, (não por acaso, a história da capa): a partir da página 76 começa La Guerra del Regno Divino, de Jô Oliveira. São 16 páginas de encher os olhos. Não que as outras histórias não fossem ótimas. E essa é a grande qualidade da publicação: grandes nomes dos quadrinhos do mundo inteiro dão brilho especial em todas as páginas da revista. Mas A Guerra do Reino Divino deu à publicação uma sofisticação gráfica única. Jô Oliveira apresenta a mais perfeita fusão entre a arte da literatura de cordel e as histórias em quadrinhos, resultando num trabalho de impacto visual que se destaca entre todos. Naquela época, em 1975, Jô Oliveira fazia carreira na Europa e era praticamente desconhecido no Brasil. Um pecado! (leia mais aqui)

A revista encerra a edição com as 13 páginas da série Fosdyke Saga, do cartunista inglês Bill Tidy, além das histórias já citadas de Popeye e Snoopy.

Enquanto foi editada a AlterLinus publicou quadrinhos de nomes como Hugo Pratt e seu Corto Maltese; Pichard e Wolinski, com Paulette; Crepax e sua Valentina, além de Moebius, Sergio Toppi e do brasileiro Jô Oliveira. O primeiro número, em 1974, trouxe o início da clássica adaptação de Ulisses, de Homero, por Lob e Pichard. Pena que não se editam mais revistas assim.

Todas as imagens que ilustram este texto podem ser ampliadas: basta clicar nelas.