A primeira HQ de aventuras do mundo é brasileira!


Um livro importantíssimo para o resgate da obra de Angelo Agostini na História da cultura brasileira é As Aventuras de Nhô-Quim & Zé Caipora, de autoria do pesquisador Athos Eichler Cardoso, cuja primeira edição foi lançada em 2002 dentro da série Edições do Senado Federal. O livro recebeu o Troféu HQ Mix na categoria Valorização dos Quadrinhos e, justamente por isso, o livro, que estava esgotado, teve uma segunda edição lançada em 2005.

O álbum teve um esmerado trabalho de restauração digital para reproduzir com a melhor qualidade possível, os capítulos das primeiras histórias em quadrinhos brasileiras, criadas pelo mestre Agostini. São elas: As Aventuras de Nhô-Quim, ou Impressões de uma Viagem à Corte, (abaixo) publicados em página dupla na Vida Fluminense, e As Aventuras do Zé Caipora, publicadas na Revista Illustrada, em Don Quixote e, numa última fase, em O Malho.
08-nhoquim Dois momentos do atrapalhado caipira Nhô-Quim

Folhear este álbum impresso em papel couchê e no formato A4 é voltar no tempo e descobrir um verdadeiro tesouro artístico, criativo e absolutamente pioneiro. É compreender melhor como era o Brasil, sua gente e seus costumes em fins do século 19. A recuperação desses documentos, portanto, é essencial para manter um registro iconográfico fiel desse período.

Publicada a partir de 1869, As Aventuras de Nhô-Quim é considerada a primeira história em quadrinhos brasileira e Agostini foi o quinto artista do mundo a publicar uma hq. A primazia de ser o pioneiro coube a um caricaturista suíço, Rodolphe Topffer, que publicou em 1827 a história Monsieux Vieux Bois. Hoje o autor é considerado o pai dos quadrinhos, apesar de seus traços serem bem primários, quase infantis (como se pode ver clicando no link de seu nome). A história Monsieur Reac, criada em 1948 pelo fotógrafo e desenhista francês Nadar, pseudônimo de Gaspard-Félix Tournachon, é considerada a segunda hq. A dupla endiabrada Max und Moritz, famosa criação do pintor e caricaturista alemão Wilhelm Busch – que inspirou a criação de Os Sobrinhos do Capitão, de Rudolph Dirks –, chegou em 1865 e, dois anos depois Ally Sloper começaria a ser publicada regularmente na revista britânica Judy com desenhos de Charles H. Ross – que também escrevia as histórias – e a elegante arte-final de sua mulher, a cartunista francesa Marie Duval, pseudônimo de Emilie de Tessier.

Uma enorme diferença de 67 anos separa a história em quadrinhos de Topffer da criação do desenhista norte-americano Richard F. Outcault, The Yellow Kid, que era alardeado aos quatro ventos como sendo o primeiro personagem dos quadrinhos (“comics” dos Estados Unidos). Como se pode ver, não é! Yellow Kid só começou a ser publicado em 1894. Até o nosso Zé Caipora, de Angelo Agostini (páginas abaixo), estreou 11 anos antes do garoto amarelo lançado no New York World, de Joseph Pulitzer!

Também não é dos Estados Unidos a primazia de ter lançado a primeira história em quadrinhos de aventuras. Tarzan e Buck Rogers, que os americanos consideram como os primeiros ‘comics’ desse gênero, foram publicados pela primeira vez em janeiro de 1929. Ou seja, 46 anos depois que Angelo Agostini passou a publicar As Aventuras de Zé Caipora.

Quando lançou o primeiro capítulo do seu Zé Caipora, em 27 de janeiro de 1883, Agostini já era um quarentão famoso, dono da principal publicação ilustrada da Corte – a Revista Illustrada – e de um traço refinado. Zé Caipora começou cômico, mas o personagem ganhou nova dimensão criativa e gráfica logo nas primeiras páginas, quando embarca numa aventura pelas desconhecidas selvas brasileiras. A arte seqüencial de Agostini é dinâmica, ágil, elegante e, como linguagem moderna de quadrinhos, antecede em muito tempo seus congêneres Tarzan e Príncipe Valente, ambos de Hal Foster; e Flash Gordon e Jim das Selvas, de Alex Raymond.

Como ressalta Athos Cardoso em seu livro, “cabe a Angelo Agostini o título de avô das tiras de aventura, como precursor da temática e a Zé Caipora, o de primeiro herói brasileiro e universal do gênero”. Realmente, As Aventuras de Zé Caipora pode ser considerada, sem sombra de dúvidas, a primeira história em quadrinhos de aventura do mundo. Que nos desculpe Hal Foster.

Clique nas imagens para ampliá-las em ótima resolução e ver os detalhes do traço de Agostini.

11 comentários sobre “A primeira HQ de aventuras do mundo é brasileira!

  1. veloso disse:

    Parabens pelo blog acima da média com muito conteudo sou quadrinhista e fui fanzineiro hoje tenho um blog onde mostro meus trabalhos. Um abraço.

  2. Athos Eichler Cathosec1934ardoso disse:

    Caro amigo,
    sou o feliz e orgulhoso pesquisador do Ze Caipora, o primeiro heroi de aventuras, reconhecido pelo maior estudioso do assunto, o professor David Kunsle da UCLA.
    Mas quem sabe quem se lembra de Ze Caipora /

    • Francisco Ucha disse:

      Caro Athos! Que honra, a sua mensagem! Parabéns pelo trabalho desenvolvido na obra de Ângelo Agostini! Tenho seus livros, J.Carlos, Memórias d’O Tico Tico e este citado no texto desta postagem. Também parabenizo-o pela sua colaboração e gentileza, que possibilitou o lançamento de O Guarany, uma importante adaptação do romance de José de Alencar realizada com maestria por Francisco Acquarone. São obras indispensáveis para quem quer conhecer um pouco da nossa História gráfica.

  3. Athos Eichler Cardoso disse:

    Caro Francisco ,
    eu pretendia colocar no Guarany a biografia do Acquarone. A que existe publicada é muito curta. Ele trabalhou com o lápis e o pincel. Publicidade.. Desenhou as primeiras HQ brasileiras no Globo Juvenil semanal. Mas o principal trabalho dele foi “João Tymbira em Redor doBrasil”
    o àlbum do mesmo fromato de O Guarany teve um impacto muito grande na minha geração e nas que me antecederam. O Acquarone desenhou uma edição de A Volta ao Mundo por dois garotos”, que foi publicado em portugues , espanhol e frances, como fasciculo. Ele teve a idéia do herói viajar pela parte do norte do Brasil perseguindo um bandido que roubara um mapa valioso do avo dele. O livro era de aventura e didático porque ,expllicava a geografia, economia e problemas sociais da regiões percorridas. Ele luta contra o Lampeão. Teve tanto sucesso que foi serializado no rádio, o primeiro do Brasil.

  4. Athos Eichler Cardoso disse:

    Francisco,
    estou indo pros 86 em julho. Graças a Deus estou colocando a minha coleção de fasciculos e livros de literatura popular na Biblioteca Nacional de Brasilia Eu coleciono desde os 27 anos. Nos sebos de P.Alegre, Rio, SP, e capitais da Europa. Pod ter melhor de quadrrinhos mas não de fascículos. Tem quadrinhos espanhois, alemães, ingleses, franceses,belgas, japoneses,italianos, de Portugal, …Tem a primeira edição do álbum do Flash Gordon. E a segunda com assinatura de Aizen e do Monteiro. Muitas séries de albuns americanos do Tarzan, Cap Cesar, Lil Abner, etc,etc,
    Um abraço.
    Athos
    Tem também o primeiro número da La Semaine de Suzette onde fica claro que ela dirigida para meninas de 8 a 14 anos. NÃO serviu de modelo para o TICO-TICO. Tenho um trabalho sobre isso.

    • Francisco Ucha disse:

      Meu caro Athos,
      Novamente você me honra com seus comentários. Gostaria muito de conhecê-lo e de ter contato com sua coleção de fascículos e livros que estarão na Biblioteca Nacional de Brasília.
      Como podemos publicar a biografia do Acquarone? Você já tem o texto sobre ele finalizado?

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